Hoje, para celebrar a poesia em seus aspectos mais originais - e originários -, trazemos alguns cantos das mulheres da tribo Kuikuro, localizada no alto Xingu, Mato Grosso. A pesquisadora Bruna Franchetto é a responsável pela preciosa recolha e tradução desses cantos, publicados no livro “Tolo Kuikúro: Diga cantando o que não pode ser dito falando”, 1997.
"As sociedades ameríndias, com toda a sua diversidade, revelam conhecimentos e tradições de uma riqueza infinita. Destaca-se a pluralidade de gêneros de fala ritualizada e de fala cantada (verbomúsica), em suas muitas possibilidades de musicalização, que opera transformações e conexões entre mundos humanos, não-humanos e supra-humanos. A fala cantada se caracteriza muitas vezes por registros especiais e qualidades esotéricas, o que tem levado alguns etnógrafos e linguistas a descrevê-la como ininteligível. A compreensão e, consequentemente, uma tradução esbarram em metáforas densas, elipses, vocábulos obsoletos, jogos de linguagem. Uma característica marcante e difusa é a versificação paralelística, onde cada repetição encerra uma variação que impulsiona a sucessão de imagens mentais, versificação que pulsa no ritmo da respiração e da dança. Quem se aproxima das artes verbo-musicais ameríndias precisa conhecer a fundo as estruturas da língua indígena, os contextos culturais, e uma já considerável literatura de etnopoéticas e suas possíveis traduções."
Trecho do artigo "Brasil de Muitas Linguas", Bruna Franchetto, 2018.
Tolo Kuikúro: Diga cantando o que não pode ser dito falando, Bruna Franchetto, 1997.
Tolo Kuikúro: Diga cantando o que não pode ser dito falando, Bruna Franchetto, 1997.
"Os cantos tolo são executados pelas mulheres kuikuro do Alto Xingu em ocasiões rituais; no privado de suas casas, elas cantam para lembrar, aprender e ensinar esse repertório tradicional de mais de trezentos cantos, internamente organizado em conjuntos e sequências. Os tolo falam de amores (nunca conjugais), sedução, desejos, decepção, disputas. São imagens minimalistas de cenas que remetem a narrativas do cotidiano."
O artigo "Brasil de Muitas Linguas", de Bruna Franchetto, está disponível na íntegra em:
Tolo Kuikúro: Diga cantando o que não pode ser dito falando, Bruna Franchetto, 1997.
Os cantos e outros rituais da comunidade Kuikuro também foram apresentados no documentário "As Hiper Mulheres" (2011), Com direção de Carlos Fausto, Leonardo Sette e Takumã Kuikuro. Confira o trailer do filme:
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