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barbie
zulmira sabia que era uma boneca porque o pai com os olhos de lobo sempre dizia Zuzinha, você é minha bonequinha. e porque, longe dos outros olhares que não entendem nada de brincar, ele brincava com ela, geralmente quando caía a escuridão e o vento deixava de visitar o lugar onde ele guardava zulmira, zuzinha, para o dia seguinte. boneca como zulmira não fala, Faz pssiuu, boneca!, por isso, de lá pra cá, ela não sabia mais a hora de sorrir ou chorar, principalmente quando ele lhe punha em posição de boneca que cai. zulmira era daquele modelo que ardia em febre às vezes e, se sangrava um pouco, acreditava ser assim mesmo isso, pruma boneca de dez anos. foi só depois que a boneca notou o seu corpinho de rã oferecendo outras formas, e se esticando por não se conter em si mesmo, elástico feito da carne que compõe o plástico da carne de bonecas como zulmira. foi o tempo em que não acreditou mais em histórias de lobos, porque agora a floresta cercou a bonequinha, os milhões de rostos de susies ainda nas embalagens, a tevê a chamá-la de criança, logo a palavra que lhe dá mais medo, medo e terror... e quando se referem à boneca zulmira como uma pinóquio sem as mentiras, então? então já tinha o corpo de sapa quando descobriu não haver loja nenhuma no mundo que vendesse bonecas com aquele nome de zulmira-zuzinha, e ela estranhou também o dia em que a dor rompeu o casulo, para brincarem de médico de verdade com ela.
mas amanhã poderá ir pra casa, levando consigo o silêncio das fadas que, como bonecas, não têm passado. na casa, já encontrará zenaide, a bonequinha que será sua para sempre. a psicóloga-susie-da-estrela disse que Zenaide não é boneca, zulmira: é gente igual a você. zuzinha não fala nada, enquanto no quarto pintado à cal não sabe porque pensa num túmulo quando entrega o peito a zenaide. e zenaide mama de verdade. fecha os olhinhos e tudo. parece boneca. só vendo.
O escritor Sidney Rocha, ministra em agosto aqui n'A Capi a oficina "Lição de economia: a escrita do conto. As aulas serão expositivas e interativas, com debates e exercícios.
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foto: Renata Victor
Sidney Rocha é contista, romancista e editor. Escritor premiado, recebeu o Prêmio Jabuti de Literatura e o Prêmio Guerra Junqueiro de Lusofonia, dentro outros. Autor da trilogia de contos Matruiska, (2009), O destino das metáforas (Prêmio Jabuti, 2011) e Guerra de ninguém (2015). Também escreveu os romances Sofia (Prêmio Osman Lins, 2014) e a trilogia “Cromane”: Fernanflor (2015), A estética da indiferença (2018) e Flashes (2020). Em 2023, lançou As aventuras de Ícaro. Ainda neste ano, lança novo romance: O inferno das repetições. Seus livros são publicados pela editora Iluminuras.
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