O ano não foi fácil, os tempos ainda são desafiadores, mas a poesia floresce mesmo sob o clima mais adverso. Nós d'A Capivara acreditamos na força transformadora da arte. Neste final de ano, pedimos aos nossos profs para indicar o seu livro favorito de poesia, dentre os lançamentos de 2021.
Alguns profs fizeram referência a um mesmo livro, outros foram buscar além mar, em Portugal, o seu favorito. O resultado é uma lista de Favoritos, que não tem melhor nem pior, serve apenas como uma pequena amostragem de tantos livros bons que estão por aí. Como roedoras de versos que somos, esperamos que essas dicas estimulem a leitura de nossa poesia, ainda tão pouco difundida.
Afinal, é na poesia que nos abrigamos, nos encontramos e por onde seguimos! <3
Gustavo Silveira Ribeiro
Leonardo Fróes Poesia reunida (1968 - 2021), Leonardo Fróes.
Editora 34
Num ano pontuado por alguns lançamentos de interesse, dos quais recordo, sendo talvez injusto e falho como é tantas vezes a memória, os livros de Leila Danziger ("Cinelândia"), Annita Costa Malufe ("Alguém que dorme na plateia vazia"), Leonardo Gandolfi ("Robinson Crusoé e seus amigos") e Ricardo Aleixo ("Extraquadro", o melhor dentre os seus últimos livros), creio ser preciso destacar a poesia de Leonardo Fróes, cuja extensa produção acaba de ser compilada e acrescida de material inédito. O domínio exemplar do verso livre e dos seus muitos ritmos e sutilezas, aliada a uma vocação verdadeiramente pensante e uma propensão ao caminho singular, que une recolhimento em si (em suas questões e sua paisagem de eleição) e cosmopolitismo de modo bastante raro entre nós, faz da publicação desta "Poesia reunida", de Leonardo Fróes, um acontecimento de primeira importância. Diferentes gerações de poetas formaram-se na companhia dos seus poemas, como é possível notar, ainda no âmbito deste ano de 2021, nos livros - em si muito diferentes - de Ana Martins Marques, André Capilé e Ismar Tirelli Neto.
Ronaldo Bressane
Robinson Crusoé e seus amigos, Leonardo Gandolfi.
Editora 34
Sou suspeito pra dizer, afinal Leo me orienta no mestrado, mas: que maravilha de livro! Daqueles que ao mesmo tempo inquietam a mente e acalmam o coração. Piscando a luneta ao leitor desde o título - quem seriam os amigos de um náufrago solitário? -, Leo propõe saídas possíveis pro apocalipse de cada dia: a ternura, o espanto, o nonsense cauterizando velhas feridas (mas ainda deixando uma frestinha passar luz). O contrário do desespero talvez não seja a esperança e sim o humor: já que o real nos leva a um deserto, o negócio é abrir um vinho, brincar com as miragens e conversar com os espíritos - do passado ou futuro.
Valentina Cantori
Ar-reverso (Atemwende), Paul Celan, traduzido por Guilherme Gontijo Flores
Editora 34
Entre as publicações de poesia deste ano, um livro que me chamou muito a atenção foi Ar-reverso (Atemwende), de Paul Celan, traduzido por Guilherme Gontijo Flores, e publicado pela Editora 34. Traduzir Celan significa deparar-se com os limites mais remotos da linguagem, com as tentativas de dizer o que não deixa de ser inefável. Esse é o paradoxo que habita a poesia de Celan, como de outros e outras poetas, que fazem da própria linguagem um amálgama de necessidade e impossibilidade. A tradução de Gontijo Flores acompanha os versos de Celan em seus movimentos bruscos e sinuosos, buscando soluções tradutórias originais a partir de sua própria língua, e mostrando como poesia há de ser lida com a mente, mas sobretudo com os sentidos.
André Capilé
Alguns dias violentos, Ismar Tirelli Neto
Editora Macondo
Mais uma vez Ismar nos apresenta seu vasto repertório de imagens incômodas, e necessárias, na tratativa dos eventos comezinhos do cotidiano, tudo com seu rigoroso trabalho inventivo, tanto no campo lexical, quanto em sua sintaxe enviesada.
Andrea del Fuego
Gaia, Antônio Martinelli
Editora Quelônio
Sou a Pronúncia do teu Nome, Thiago Medeiros
Editora Urutau
Ayelén Medail
Brusco, Cecília Furquim
Editora Urutau
Brusco, como uma cólica, como um aguaceiro de verão e, portanto, também fresco e revigorante.
Isabella Martino
Alguns Dias Violentos, Ismar Tirelli Neto
Editora Macondo
Um livro em que o fim do mundo é uma espécie de morada, que apresenta o mais íntimo em um mundo em vias de acabar. Revela um modo de existir rodeado de escuridão, as sombras deste nosso tempo. É o livro do ano.
Sergio Maciel
Azagaia, de André Capilé
Editora Macondo
Carmen Faustino
O livro negro dos Sentidos, com poemas de Aira Luana Nascimento, Carmen Faustino, Vassia Valle Atriz, Conceição Evaristo, Dandara Suburbana, Debora do Nascimento, Helena Theodoro, Janete Santos Ribeiro, Jaque Alves, Juh de Paula, Lourence Alves, Luciana Luz, Luciana Palmeira, Maitê Freitas, Miriam Alves, Rosane Jovelino, Selma Maria da Silva, Sheila Martins e Taís Espírito Santo.
Mórula Editorial
Coletânea de poemas de 23 escritoras negras, organizada por Angélica Ferrarez, Jurema Araújo e Fabiana Pereira.
DirceuVilla
Leonardo Fróes Poesia reunida (1968 - 2021), Leonardo Fróes.
Editora 34
O pedido de destacar uma publicação de poesia neste ano de 2021 me faz dizer sem pensar duas vezes: “A Poesia Reunida de Leonardo Fróes”. Um de nossos maiores & mais inventivos poetas ─ além de grande tradutor ─, homem singularmente importante para o convívio com a natureza, & do lado certo do peito & da História. Sua poesia, que vai das mais intensas invenções de linguagem à escrita mais límpida, é a poesia de que o Brasil precisa hoje & que, não tenho dúvida, amará sempre.
Marino Marovatto
Alguns Dias Violentos, Ismar Tirelli Neto
Editora Macondo
Maria Carolina Casati
No útero não existe gravidade, Dia Nobre
Editora Penalux
Acontece que o livro que preciso indicar é híbrido, romance-auto-ficção-prosa-poética. Tudo isso assim, junto-e-misturado-ao-mesmo-tempo-agora dentro e fora de nós. No útero não existe gravidade (Penalux) é uma experiência (quase) visceral de leitura. Seja pela frase inicial “mamãe é tão divertida, espero que ela morra”, seja pelas desventuras vividas pela protagonista para compreender sua mãe-mulher, tudo aqui nos grita que “existir, por si, é uma experiência de quase morte”. É preciso que essa mãe morra metaforicamente para que a nossa heroína amadureça. É preciso que muitas imposições da sociedade desfaleçam para que ela consiga dizer que não nasceu para Cristo, ela é “Pilatos”. E é nesse texto anfíbio que, assim como o animal que vive nas águas, percebemos que depois que nos derramamos ao nascer, que ficamos em constante sentido de desamparo, é possível e necessário que encontremos novas margens, que nos aterremos em nós mesmxs. Só assim a gente não se deixa mais definir pelo trauma, só assim a gente cresce. Muito obrigada, Dia Nobre, por mais essa catarse narrativa!
Isabela Bosi
Alguém que dorme na plateia vazia, Annita Costa Malufe
Alguém que dorme na plateia vazia" é um livro que não termina – para se ler em voz alta, de uma só vez, como quem perde o fôlego.
Joca Reiners Terron
Robinson Crusoé e seus amigos, Leonardo Gandolfi.
Recomendo com ênfase “Robinson Crusoé e seus amigos”, de Leonardo Gandolfi (Editora 34), um livro narrativo e comovente, em muitos sentidos, que conduz as experiências anteriores do poeta a um lugar onde ousadia formal, humor e o inesperado se chocam, gerando fogo. Também destaco “Engenheiro Fantasma”, de Fabrício Corsaletti (Companhia das Letras), em vias de sair, mas que já li no original e adorei.
Ana Marta Cattani
Risque esta palavra, Ana Martins Marques
Um livro em que os poemas nos arrebatam como as ondas. E nesse vai-e-vem somos levados por um mar de palavras: um mar que está logo ali, mas sempre distante.
As 29 Poetas hoje, com poemas de Adelaide Ivánova, Maria Isabel Iorio, Ana Carolina Assis, Elizandra Souza, Renata Machado Tupinambá, Bruna Mitrano, Rita Isadora Pessoa, Ana Fainguelernt, Luz Ribeiro, Danielle Magalhães, Catarina Lins, Érica Zíngano, Jarid Arraes, Luna Vitrolira, Mel Duarte, Liv Lagerblad, Marília Floôr Kosby, Luiza Romão, Raissa Éris Grimm Cabral, Cecília Floresta, Natasha Felix, Nina Rizzi, Stephanie Borges, Regina Azevedo, Valeska Torres, Bell Puã, Yasmin Nigri, Dinha, Marcia Mura.
As 29 Poetas Hoje é uma antologia que já nasce clássica, reavivando o espírito de 26 Poetas Hoje, antologia organizada por Heloísa Buarque de Hollanda em 1976 e que reuniu poetas da chamada geração mimeógrafo (ou marginal). Um livraço hoje, que mostra a diversidade e a potência das vozes femininas da nossa poesia contemporânea.
Ismar Tirelli Neto
Azagaia, André Capilé
Editora Macondo
Robinson Crusoé e seus amigos, Leonardo Gandolfi
Sofia Mariutti
Cães de Chuva, Daniel Jonas
Editora Assirio & Alvim
Eu diria que tem a riqueza vocabular que é própria dos bestiários: escrever sobre os bichos nos obriga a buscar palavras que, como o próprio autor diz, estão enterradas, esquecidas, e a poesia opera como uma “arca de noé da língua portuguesa” (nas palavras de jonas).
Diogo Cardoso
O físsil, Davi Araújo
Se a boa poesia é aquela que leva a linguagem ao seu limite, Davi Araújo, em seu O físsil, seguramente consegue alcançar esse limite produzindo uma poesia cujas palavras estremecem e provocam uma explosão dos sentidos.
poesia 2021
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