foto: https://ellibero.cl/opinion/alejandro-san-francisco-gabriela-mistral-a-75-anos-del-premio-nobel/
Gabriela Mistral (1889-1957) foi uma poeta, diplomata e pedagoga chilena. Em 1945, foi agraciada com o Prêmio Nobel de Literatura, sendo a primeira pessoa da América Latina a receber o galardão.
Inauguro este espaço de poesia e tradução com dois poemas de Mistral traduzidos pela poeta e tradutora mineira Henriqueta Lisboa. Elas se conheceram no Rio de Janeiro na década de 1940, durante os anos em que Gabriela exerceu cargo consular em Petrópolis.
Adentrar-se na poesia mistraliana pela mão de Henriqueta Lisboa significa, a meu ver, reconhecer e fortalecer os laços que as mulheres traçaram (e ainda o fazem) em um âmbito literário notoriamente masculino.
O poema A estrangeira foi publicado em seu terceiro livro de poemas, Tala (1938), e compõe, junto a outros quatro poemas, a seção “Saudade”, que, como o nome já aponta, foram escritos quando Gabriela esteve em contato com a língua portuguesa durante o tempo que morou em Portugal.
A vida de Gabriela Mistral foi marcada por um constante deslocamento. Ela atribuiu a si mesma o adjetivo vagabunda, em referência à sua errância. Saiu do Chile em 1922 para fazer parte da equipe de alfabetização pós-revolucionária no México e voltou à sua terra natal apenas em duas ocasiões. Entre conferências e palestras sobre educação e literatura, Gabriela andou o velho mundo: morou na França, quando era representante da América Latina na Organização das Nações, na Itália, na Espanha e em Portugal, assumindo responsabilidades consulares. Também nesta função, morou no Brasil entre 1940 e 1945, estabelecendo-se em Petrópolis, onde recebeu a notícia do Nobel. Passou vários períodos nos Estados Unidos, país onde foi publicado seu primeiro livro, Desolación, e onde veio a falecer em 1957 em decorrência de um câncer de pâncreas.
O poema “A bailarina” foi publicado em seu último livro, Lagar (1945) e faz parte da seção “Locas mujeres”, que contém dezesseis poemas hendecassílabos de rima irregular. O título do livro, Lagar, se refere ao recipiente onde a uva é pisada para produzir vinho e onde vão se acumulando restos de cepas anteriores. Nas palavras de Gabriela, os restos de cepas anteriores são poemas que foram se acumulando no decorrer de sua vida, poemas que precisavam de correção, poemas ainda não finalizados.
Gabriela Mistral foi uma escritora prolífera. Ela mesma conta, em uma conferência de 1938, que escrevia sobre uma tábua que colocava em seu colo para poder escrever em qualquer lugar. Exigente e rigorosa, Mistral corregia meticulosamente seus poemas com a ajuda de duas grandes companheiras de vida: Palma Guillén e Doris Dana. No arquivo de áudio, pode-se apreciar uma conversa entre Doris e Gabriela, corrigindo o poema La que camina, também reunido na seção “Locas mujeres” do seu livro Lagar.
foto: https://pgl.gal/gabriela-mistral-educadora-e-poeta-segundo-o-filme-a-gabriela-e-varios-documentarios/
Ayelén Medail é pesquisadora, tradutora e professora. Oriunda de Entre Ríos, Argentina, mora no Brasil desde 2012. É doutoranda em Literatura Hispano-americana pela USP, onde pesquisa os ensaios de Gabriela Mistral e Alfonsina Storni em chave ginocrítica. Traduziu Dezenove garras e um pássaro Preto e Saboroso Cadáver, de Agustina Bazterrica (Darkside), História do Leite, de Mónica Ojeda (Jabuticaba) e A arte do erro, de María Negroni, em parceria com Diogo Cardoso (100/cabeças).